Post-205

Lista dos melhores livros de todos os tempos (www.thegreatestbooks.org)

100. Decameron, Giovanni Boccaccio (1312-75)

O livro “Decameron” (ou Decamerão) foi escrito entre 1348 e 53. A estrutura da obra é composta por 100 contos, ou novelas, relatados durante dez dias por um grupo de sete moças e três rapazes que se reúnem em um castelo próximo a Florença para fugirem da temida Peste Negra. O título provém do grego deca (dez) e hemeron (dias). Os temas abordados são bastante diversos, com componentes trágicos, humorísticos, religiosos, eróticos, fornecendo um amplo retrato da vida italiana naquele período. O livro, que se constitui em uma ruptura com a moral medieval – baseada no amor espiritual – é visto como o início do realismo na literatura ocidental.  

A obra, escrita no dialeto toscano da língua fiorentina – que viria a se converter no idioma italiano – apresenta detalhes sobre a Peste Negra, seus sintomas, evolução, comenta a ineficácia da Igreja Católica no combate à epidemia e destaca as reações das pessoas, desde uma entrega absoluta à luxúria até o recolhimento para a condução de orações. O texto do “Decameron” influenciou vários escritores clássicos, como Shakespeare, Molière, Voltaire e Lope da Vega. Por sua vez, constata-se que o próprio Boccaccio buscou inspiração em antigos escritores europeus e asiáticos, cujas obras foram redigidas como reflexo das tradições orais.

Giovanni Boccaccio, cuja vida é pouco conhecida na sua evolução histórica, era filho de um mercador, que, imagina-se, desejaria que o filho seguisse a mesma profissão. Boccaccio preferiu as letras. Ele era um grande especialista em Dante (1265-1321), tendo escrito uma biografia desse célebre escritor. É fato conhecido que o título original da obra-prima de Dante, “Commedia” foi ampliada por Boccaccio para “La Divina Commedia”, que se tornou o nome definitivo da obra.  

Boccaccio escreveu diversos outros livros, principalmente poemas, que descansam sob a sombra do Decameron, sua obra-prima. Escreveu também uma biografia de 106 mulheres (De mulieribus claris, 1361), tanto no contexto mitológico quanto na abordagem histórica.

Vários filmes foram rodados com base no Decameron. Os dois mais conhecidos são: 1924, direção do britânico Herbert Wilcox (1890-1977), com o ator americano Lionel Barrymore (1878-1954) e 1953, Decameron Nights (em português teve o chamativo título de “Deliciosas Noites de Amor”), direção do argentino Hugo Fregonese (1908-87) e com a norte-americana Joan Fontaine (1917-2013) e o francês Louis Jourdan (1921-2015).

Quanto às traduções brasileiras, existem basicamente duas: a primeira foi a de Raul de Polillo em 1956, publicada originalmente pela Livraria Martins, mas relançada por diversas outras editoras. A tradução de 1970, atribuída a Torrieri Guimarães, parece não passar de uma readaptação da anterior. A outra tradução, mais recente, é a de Ivone C. Benedetti, lançada pela L&PM em 2015. Destaca-se a carência de tradutores brasileiros para verterem um longo livro em dialeto toscano. Estas duas traduções mencionadas referem-se à obra completa do “Decameron”, cujo conteúdo chega a superar 1.300 páginas. Em contrapartida, existem muitas seleções e antologias que abordam apenas uma parte do livro.    

Língua japonesa (2)

Os primeiros textos em língua japonesa remontam ao século VII, originalmente escritos em caracteres chineses. No início do século XVII se consolidou como língua japonesa moderna o dialeto Kansai, falado na região de Quioto, com a padronização do idioma tendo ocorrido no final dos anos 1880. Deve-se ressaltar que o japonês não tem qualquer relação genética com o chinês, embora faça uso dos caracteres chineses Kanji em seu sistema de escrita. Em determinadas situações é possível a comunicação entre pessoas japonesas e chinesas pela forma escrita das duas línguas, mutuamente compreensíveis, mas nunca na forma oral.

O sistema de escrita da língua japonesa é composto por três modalidades:

  • Kanji: ideogramas de origem chinesa usados para a representação de substantivos, adjetivos e verbos, além de nomes próprios;
  • Hiragana: silabário (conjunto de símbolos que representam sílabas na formação das palavras) usado para partículas gramaticais e palavras para as quais não há a possibilidade de uso do Kanji;
  • Katakana: silabário utilizado na construção de palavras e nomes estrangeiros e de onomatopeias.

Além disso existe o romaji, que é a transliteração para caracteres latinos, muito usado pela grande mídia e na área de marketing. Para tal é empregado, principalmente, o sistema Hepburn, criado em 1867 pelo missionário James Curtis Hepburn.

A escrita japonesa pode ser feita na forma chinesa, ou seja, em colunas do topo para o rodapé, ordenadas da direita para a esquerda, ou então na forma ocidental, isto é, em linhas horizontais escritas da esquerda para a direita.

A presença pioneira de comerciantes portugueses no século XVI fez com que a língua japonesa herdasse vários termos da língua portuguesa. Alguns exemplos: kurusu (cruz), biidoro (vidro), botan (botão), furasuno (frasco), irumaa (irmão).  Conforme já apontamos em um Post anterior, a palavra arigatoo não colhe suas raízes no português “obrigado”, como muitos creem, mas sim no verbo arigatashi, usado no budismo quando há “dificuldade para se expressar a gratidão”.

Da língua inglesa foram obtidas algumas versões bem curiosas, como fooku (garfo, instrumento que não é usado na culinária japonesa), gaarufurendo (namorada) ou aisukurimu (sorvete). É a modernidade chegando aos idiomas.

O japonês é uma língua aglutinante, com ausência de prefixos. Não há artigos, número gramatical ou gênero. Os verbos são conjugados por tempo e voz, mas não por pessoa. Não há a forma plural. Assim, a palavra hon pode significar um livro, o livro, os livros. Existem apenas dois tempos verbais: passado e “não passado”, o qual engloba o presente e o futuro. O destaque conferido ao tempo passado está em conformidade com o culto religioso aos ancestrais. A maioria dos lares japoneses possui um altar onde estão armazenadas as cinzas dos antepassados, para os quais são dirigidas as orações.

Vencedores do Prêmio Camões de Literatura (36)

2023: João Barrento (1940-)

O ensaísta, cronista e tradutor João Barrento nasceu na vila de Alter do Chão, na região do Alentejo português. Certamente muitos de nossos leitores conhecem, ou já ouviram falar, na vila homônima brasileira, que é um distrito de Santarém, no estado do Pará, a qual foi assim batizada em homenagem à localidade portuguesa. Por sua vez, a Santarém brasileira também se origina da Santarém portuguesa, são assim os curiosos rastros da colonização.

Barrento é licenciado em Filologia Germânica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (1958-64). De 1965 a 68 foi professor (leitor) de português na universidade alemã de Hamburgo. Nas ciências da Educação, o termo “leitor” designa alguém que, comissionado pelo governo do seu país, ensina sua língua e literatura em uma universidade estrangeira. No seu retorno Barrento tornou-se professor de Língua e Literatura alemã na Universidade Nova de Lisboa, atividade essa exercida até a aposentadoria. Barrento recebeu o mais importante prêmio da língua portuguesa (Camões), sem ter escrito sequer um único romance, apenas ensaios e crônicas (cerca de 20), os quais também podem se constituir em renomado exemplo de literatura. Contudo, o grande destaque na carreira literária de Barrento são as celebradas traduções de um grande número de escritores alemães. Conforme salientamos no Post 202, sua tradução da monumental obra “Fausto”, de Goethe, foi lançada em 2023 pela editora Autêntica.   

Frase para sobremesa: Ninguém pode, por muito tempo, ter um rosto para si mesmo e outro para a multidão sem no final confundir qual deles é verdadeiro (Nathaniel Hawthorne, 1804-64).

Até a próxima!

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