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Lista dos melhores livros de todos os tempos (www.thegreatestbooks.org)

28. As mil e uma noites

O título refere-se a uma coleção de histórias e contos populares originários do Oriente Médio e do sul da Ásia. Eles foram compilados em língua árabe a partir do século IX. Acredita-se que tal coleção tenha sido traduzida do persa no século VIII, mas esses eventuais volumes estão perdidos. Já a compilação árabe encontra-se conservada em três volumes na Biblioteca Nacional de Paris. Os manuscritos abrangem o período de 282 noites. Existe ainda uma compilação egípcia, feita na segunda metade do século XVIII, a qual apresenta os contos de todas as 1001 noites. Não existe uma única versão definitiva da obra, já que os antigos manuscritos árabes diferem no número e no conjunto de contos.

O livro, como um todo, consiste em uma série de histórias em cadeia narradas por Xerazade (ou Sherazade ou Sheherezade), esposa do rei Xariar. Este governante, traumatizado com a traição da primeira esposa, casa-se com uma nova noiva todas as noites, mandando matá-las na manhã seguinte. Xerazade escapa a esse destino contando histórias maravilhosas até o amanhecer, quando o conto é interrompido. Esta modalidade de contos estruturados em cadeia já era comum na literatura indiana.

A primeira tradução para o mundo ocidental foi feita pelo escritor e orientalista francês Antoine Galland (1646-1715). Nessa época, a França vivia o encantamento de um novo gênero literário denominado “contos de fadas”, cuja expressão máxima foi o escritor Charles Perrault (1628-1703), autor de clássicos como “Chapeuzinho Vermelho”, O Gato de Botas”, “A Bela Adormecida”, “Cinderela” e “O Pequeno Polegar”. Quem não se lembra? Foi nesse contexto que a tradução das “Mil e Uma Noites” encontrou uma enorme aceitação por parte do público europeu. Na verdade, a tradução de Galland foi muito mais uma recriação da obra, com alterações em falas de personagens, retirada de versos poéticos e inserção de contos, como os de Aladim e de Simbad, o Marujo, que não faziam parte da compilação original.

Neste aspecto merece destaque a tradução feita diretamente do árabe para o inglês por Sir Richard Burton (1821-90), polímata e um dos maiores aventureiros que o planeta já conheceu. Não confundam com o ator britânico homônimo (1925-84), que adotou esse pseudônimo para homenagear o desbravador de terras e mares. O nosso Burton morou por muitos anos como diplomata na Índia e em diversos países árabes. Certa feita, em um rasgo de atrevimento – alguns diriam de loucura – ele pintou o corpo de preto e entrou na cidade proibida de Meca. Foi provavelmente o primeiro homem branco a cumprir essa arriscada missão. Esteve alguns anos no continente africano nas famosas expedições para descoberta das nascentes do Rio Nilo. Também andou explorando partes do Brasil, sendo a primeira pessoa conhecida a navegar integralmente o Rio das Velhas, afluente do Rio São Francisco, e que passa pela cidade de Belo Horizonte. Nessa ocasião ele passou alguns dias na fazenda do meu tataravô, cônsul da Alemanha em Minas Gerais. Este encontro está relatado nas memórias de Burton. Como teria sido a conversa, quais os temas abordados? Deixemos para a nossa imaginação. A tradução de Burton das “1001 Noites” para o inglês é considerada por muitos analistas como sendo a mais erudita.

Existem diversas versões em português desse famoso livro, mas todas elas consistindo em traduções provenientes dos idiomas francês e inglês. Mas há uma exceção, talvez pouco conhecida para a maioria dos leitores. Nosso Imperador Pedro II (1825-91), que conhecia 13 línguas, naturalmente em graus variados de domínio, iniciou a tradução para o português das “1001 Noites”, baseada no original árabe. Contudo, por problemas de saúde, a obra ficou inacabada e nunca foi publicada.         

A língua aramaica

O aramaico clássico ou imperial era a língua principal nos impérios da Persa, Babilônia e Assíria. Ele serviu como língua franca no Oriente Médio do século VII a.C. até o século VII, quando foi substituído pelo árabe. Ainda hoje é falado por núcleos populacionais no Iraque, Turquia, Irã, Armênia, Geórgia e Síria, sendo também utilizado em cerimônias religiosas por comunidades cristãs na Síria, Líbano e Iraque. Estima-se em cerca de 400.000 o número atual de falantes do aramaico. O nome da língua é originário de Aram, que foi uma antiga região na parte central da atual Síria. O idioma possui diversos exônimos (termo pelo qual um nome próprio é conhecido em outra língua). Os gregos, por exemplo, não utilizavam o nome “aramaico”, mas sim “língua síria”.

Trata-se de um idioma semítico, mostrando fortes semelhanças com o hebraico. Na verdade, o alfabeto aramaico, por sua vez derivado do fenício, serviu de base para o alfabeto hebraico quadrático e cursivo. O mais correto seria designar o aramaico como sendo um grupo de idiomas ou de dialetos afins. Um dos mais conhecidos é o siríaco, que possui alfabeto próprio, usado até hoje como língua litúrgica dos maronitas católicos e dos católicos sírios. A grande divulgação do idioma aramaico provém do fato de ele ter sido a língua falada por Jesus Cristo. Naquela época existiam pelo menos sete dialetos do aramaico, todos mutuamente inteligíveis, sendo que Cristo, provavelmente, utilizava o aramaico galileu. Merece destaque o único filme comercial, até hoje, falado em aramaico: “A Paixão de Cristo” (The Passion of the Christ), lançado em 2004, com direção de Mel Gibson (1956-) e tendo o ator Jim Caviezel (1968-) no papel de Cristo. A obra retrata as últimas doze horas da vida de Cristo. O elenco, instruído por um linguista, falava em aramaico e em latim. Inicialmente, a ideia da produção era a de que não houvesse legendas, sendo o significado das frases deduzido do contexto, da postura corporal e gestual dos atores. Ao final, optou-se pela inserção de legendas para facilitar o acompanhamento por parte do público.  

Uma das frases bíblicas mais conhecidas em aramaico é aquela oriunda do Evangelho de Mateus (na verdade, extraída de um salmo de Davi) e que teria sido proferida na cruz por Cristo: Eli, Eli, lamá sabakhtaní (Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?).  Sob o aspecto gramatical, a língua aramaica é muito semelhante à hebraica, apresentada nos Posts anteriores. No entanto, predomina nas frases a ordem V-S-O. Os pronomes pessoais são: enā, att/att, hu/hi, nahnan, atton/atten, hennon/hennen. Numerais de 1 a 10: hadh, tren, tlotho, arb’o, khamsho, shto, sav’o, tmoyo, tesh’o, esro. Duas expressões úteis: Safro bricho (Bom dia) e Yishar (obrigado).    

Palavras originárias de nomes de lugares ou povos (1)

Água de Colônia: tipo de perfume mais suave (em francês eau de Cologne) criado pelo perfumista italiano Johann Maria Farina (1685-1766) na cidade de Colônia (Alemanha).

Algoz: executor de pena de morte(nome de uma tribo guerreira no Oriente Médio de onde eram recrutados os carrascos).

Astracã: agasalho de pele animal (de Astrakhan, cidade na Rússia).

Baioneta: arma branca pontuda (de Bayonne, cidade no sul da França, onde foi inicialmente fabricada).

Bangalô: casa circundada de varandas (do hindi bangla, nome da etnia “bengali”, pioneiros na construção deste tipo de moradia).

Barbante: fio para atar (do Ducado de Brabante, na Bélgica, conhecido pelo artesanato de cordões de cânhamo).

Frase para sobremesa: Os meus dias de ontem caminham comigo. Eles mantêm o passo, são os rostos cinzentos que espiam por cima do meu ombro (William Golding, 1911-93)

Bom descanso!

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