Post-128

Lista dos melhores livros de todos os tempos (www.thegreatestbooks.org)

22. Ao farol (To the Lighthouse), Virginia Woolf (1882-1941)

A obra, de forte cunho autobiográfico, narra as visitas feitas por uma família inglesa à ilha de Skye (localizada no Arquipélago das Hébridas, Escócia) onde existe um farol nas proximidades. As visitas são apenas um pano de fundo para o desenvolvimento de reflexões e exploração das tensões familiares. O texto, que descreve o transcurso de dois dias, separados entre si por dez anos, tem muito mais pensamentos e observações do que propriamente diálogos. Quase nada acontece, é só a vida se escoando. Woolf considerava este livro, publicado em 1927, como sendo sua melhor obra.

Os romances de Virginia Woolf adotam a técnica literária do “fluxo de consciência”, que se assemelha a um monólogo interior dos personagens. Preponderam as características não lineares nos processos de pensamento, a exemplo do que ocorre nos livros de William Faulkner e James Joyce. Em minha visão pessoal, são obras que exigem uma leitura mais cuidadosa. A autora destacava que, como o mundo é muito complexo, ele deve ser explorado pelos escritores por meio das experiências próprias de cada indivíduo. Woolf, que era o sobrenome do seu marido, foi reconhecida internacionalmente como escritora de vanguarda durante a década de 1920. Após um período subsequente mais apagado, ela foi redescoberta somente após sua morte. Era filha de um editor, sendo que mais tarde ela também fundou uma editora juntamente com o esposo Leonard Woolf. Suas obras literárias refletem a própria angústia existencial que a invadia por determinados períodos. Seu comportamento tinha as características do que hoje é conhecido como transtorno bipolar. A última grande crise que teve levou-a ao suicídio por afogamento em um rio. Na vida pessoal tinha uma amante, em conformidade com a ampla abordagem de temas de feminismo e lesbianismo em vários de seus livros.

Merece destaque o aspecto das traduções (pelo menos cinco) feitas para o português, ou seja, em edições brasileiras. Enquanto algumas levam o título de “Rumo ao farol”, outras o sintetizam para “Ao farol”. A tradução mais recente, feita por Paulo Henriques Britto (1951-) e publicada em 2023 pela Cia. das Letras, avançou ainda mais a discussão devido a um título inovador: “Passeio ao farol”. As obras literárias, embora não apresentando conteúdos orgânicos, são certamente seres vivos que podem evoluir para um lado ou outro, se modificando de alguma maneira e trazendo consigo uma espécie de dinamismo que é a própria expressão da vida.    

A língua árabe (1)

O idioma árabe pertence ao grupo semítico, juntamente com o hebraico, o maltês (Post 107), o aramaico e outras línguas faladas em parte do continente africano. A etnia histórica dos semitas compreende, principalmente, os hebreus, assírios, aramaicos, fenícios e árabes. A etimologia da designação do grupo linguístico deriva do nome de Sem, um dos filhos de Noé. A língua árabe é falada por cerca de 280 milhões de pessoas, distribuídas principalmente no Oriente Médio e no Norte da África, o que constitui a maior continuidade geográfica de países vizinhos falando a mesma língua. Não se deve confundir os falantes de árabe com os praticantes do islamismo. Embora a quase totalidade dos usuários do árabe sejam muçulmanos, a afirmativa inversa não é verdadeira, dado que países populosos, a exemplo de Bangladesh, Indonésia e Malásia, que são majoritariamente islâmicos, não se expressam por meio do idioma árabe. Ele é a língua oficial em 26 países da Ásia e da África: Oriente Médio: Arábia Saudita, Barein, Catar, Emirados Árabes Unidos, Iêmen, Iraque, Israel, Jordânia, Kuwait, Líbano, Omã, Palestina, Síria; Norte da África: Argélia, Egito, Líbia, Marrocos, Mauritânia, Saara Ocidental, Tunísia; restante da África: Chade, Djibuti, Eritreia, Ilhas Comores, Somália, Sudão. Obviamente, uma ocupação geográfica tão extensa facilita a formação de inúmeros dialetos, por vezes mutuamente incompreensíveis entre si. Existe uma corrente entre os linguistas a qual propõe que cada uma das variantes nacionais do árabe seja considerada como uma língua independente. Tal desagregação não é levada a cabo por questões de cunho político e, principalmente, de natureza religiosa, pois muitos julgam que a essência do poder islâmico seria prejudicada com uma eventual fragmentação idiomática. Deve-se destacar que o Árabe Padrão Moderno, também chamado de literário, que é a versão utilizada em documentos oficiais, nas universidades, em publicações científicas e na mídia em geral é facilmente compreensível para todos os falantes alfabetizados do mundo árabe. Por outro lado, a linguagem coloquial, que é aquela utilizada na maior parte do tempo, abriga muitas diferenças regionais. Assim, por exemplo, um marroquino, ao conversar com sua família, jamais será entendido por um iraquiano ou libanês. Nota-se, portanto, com o árabe um clássico caráter de diglossia, ou seja, quase todos os habitantes do mundo árabe falam, pelo menos, dois idiomas (a língua literária e as variedades nacionais). Conforme já destacamos nesses vários Posts, existem ainda os subdialetos, o que aumenta consideravelmente o número de variantes linguísticas. O Egito, que é o país com o maior número de falantes de árabe (89 milhões), apresenta uma forte divulgação do seu dialeto na mídia, principalmente em filmes, o que tem levado à sua maior compreensão no restante dos países árabes.  

Uma variante bastante conhecida do idioma é o chamado árabe levantino, falado nos países do Levante asiático, região que compreende Líbano, Síria, Palestina, Israel e Jordânia, com o total de 45 milhões de habitantes. A fonética do árabe levantino é, em muitos casos, distinta daquela do árabe padrão, inclusive com a perda de determinados sons.

O Brasil é um dos países do mundo que mais receberam a imigração árabe, principalmente a partir de 1880. Estima-se que de dois a seis milhões de brasileiros sejam descendentes diretos de sírios e libaneses. A maioria deles já perdeu a comunicação verbal ou escrita em árabe. Como Síria e Líbano fizeram parte do Império Otomano até a Primeira Guerra Mundial, cultivou-se, no Brasil, o hábito de designar tais imigrantes como “turcos”, o que não tem qualquer sentido étnico ou linguístico.        

(continua no próximo Post)

A letra cedilha

Muito gracioso, esse sinal gráfico (ç) colocado abaixo da letra “c”, serve para indicar o som da sibilante surda “s”. A cedilha foi inventada pelos espanhóis no século XI, sendo mais tarde substituída pela letra “z”. Daí a denominação de zedilla (z pequena). Ela é usada antes das vogais a, o e u. Até o século XVI podia ser colocada também no início das palavras em português (no idioma francês ela ainda tem essa liberdade). Nas línguas ocidentais é encontrada, além do português e francês, também no mirandês, loreno, letão, albanês, manês e liguriano (já vimos todas essas línguas em Posts anteriores). Ela existe ainda na língua vêneto, mas aí com o som de th. Nos idiomas túrquicos e iranianos a cedilha tem a pronúncia de tch.  

Frase para sobremesa: De onde é que recebi nutrição para minha escrita? Ninguém se lembra do nome da vaca que lhe forneceu cada gota de leite que bebeu (Shmuel Yosef Agnon, 1888-1970).

Até a próxima!

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