Lista dos melhores livros de todos os tempos (www.thegreatestbooks.org)
19. Anna Karenina (AHHA KAPEHИHA), Liev Tostói (1828-1910)
A obra, aclamada por grandes escritores do mundo, começou a ser publicada em uma revista de 1875 a 77. Devido a desacordo com o editor em relação à parte final do livro, o contrato com a revista foi rescindido, mas logo saiu a publicação do texto completo em livro (1877). Algumas opiniões sobre o romance: “impecável como obra de arte” (Dostoiévski), “o romance social mais poderoso de todos os tempos” (Thomas Mann), “o melhor romance já escrito” (William Faulkner).
O livro descreve a vida de Anna Karenina, esposa do alto servidor público Karenin (daí vem o sobrenome da esposa) e que se torna amante de um oficial de cavalaria, o conde Vronsky. A base do enredo é exatamente o relacionamento extraconjugal de Anna, mas tendo como pano de fundo a decadência da Rússia czarista, os sentimentos de ciúmes e suspeições em vários graus de irracionalidade e a futilidade da vida nos salões da nobreza. A obra apresenta um desfile de dezenas de personagens, de distintas classes sociais, que discutem os eternos temas de família, paixões e religião, cada um deles cultivando seus sucessos e fracassos, que podem ser resumidos em uma das mais inspiradas frases do livro: “toda a diversidade, todo o encanto, toda a beleza da vida é feita de sombra e de luz”. Vronsky exige que Anna se divorcie, mas ela se depara com a recusa do marido. Os amantes fogem então para a Itália, em uma viagem que não traz o desafogo que era esperado. Após o retorno, Anna se sente cada vez mais ansiosa e isolada.
A monumental obra teve muitas adaptações para as telas do cinema. Uma delas, lançada em 1935, tem a presença da celebrada atriz sueca Greta Garbo (1905-90). Já apresentamos, no Post 116, um resumo da vida do genial escritor Tolstói.
Existem diversas edições brasileiras do romance. As duas últimas, das listadas a seguir, já trazem o título com a pronúncia russa do nome: Anna Kariênina. A maioria dos caros leitores já deve saber que a frase de abertura do livro é, provavelmente, a mais festejada da literatura. Coloco abaixo o texto da frase nas quatro principais edições brasileiras. Leiam com vagar, apreciem as palavras e vejam como é complexa a arte da tradução, pois todas as versões têm seu encanto e tentam refletir, da melhor maneira possível, o conteúdo do original russo.
Edição da Martin Claret, tradução de Oleg Almeida (1971-, nascido em Belarus): Todas as famílias felizes se parecem umas com as outras, cada família infeliz está infeliz à sua maneira.
Edição da Nova Fronteira, tradução de Lúcio Cardoso (1912-68; a tradução foi feita a partir da versão em francês): Todas as famílias felizes se parecem, as famílias infelizes são infelizes cada qual ao seu modo.
Edição da Cosac & Naify, posteriormente editada pela Companhia das Letras, tradução de Rubens Figueiredo (1956-): Todas as famílias felizes se parecem, cada família infeliz é infeliz à sua maneira.
Edição da Editora 34, tradução de Irineu Franco Perpétuo (1971-): Todas as famílias infelizes são parecidas, cada família infeliz é infeliz ao seu próprio modo.
A língua curda
O idioma curdo (kurdi) pertence ao grupo das línguas iranianas. O Curdistão era uma região histórico-cultural do Oriente Médio, ocupando uma área aproximada de 500.000 km2. Atualmente seu território está dividido em partes da Turquia, Irã, Síria e Iraque. O povo curdo constitui a maior nação sem estado do mundo. A rigor, não existe uma língua curda propriamente dita, mas uma variedade de dialetos que se espalham em um continuum. Como já vimos, este termo se refere à característica de os dialetos muito próximos entre si, em termos de localização, serem mutuamente inteligíveis, ao passo que aqueles mais afastados não são comunicáveis entre si. Isto confere ao idioma curdo uma característica de macrolíngua, como se houvesse muitos filhotes descendentes de uma única mãe. Outra questão interessante se refere aos alfabetos utilizados. O alfabeto latino para a grafia do curdo é usado na Turquia, Síria e Armênia, enquanto o árabe é encontrado no Iraque e no Irã. Em algumas áreas da antiga União Soviética usa-se o alfabeto cirílico. Finalmente, no norte do Iraque, onde vive a comunidade étnico-religiosa dos Yazidi – uma prática ligada ao zoroastrismo – o curdo é escrito no alfabeto próprio dos Yazidi. Vejam que não estamos nos referindo a uma sequência temporal de mudanças de alfabetos, como ocorreu com várias línguas túrquicas, mas ao emprego de quatro alfabetos de forma simultânea.
O dialeto mais relevante no número de falantes é o Kurmanji, originário da região norte do Curdistão, escrito em um alfabeto latino modificado e utilizado por 15 a 20 milhões de pessoas. O segundo dialeto é o Sorani, que é um dos idiomas oficiais do Iraque, além do árabe, falado por cerca de sete milhões de usuários. Foi ele que serviu como base para a ortografia de uma língua curda unificada, a qual, na prática, é falada por muito pouca gente. Também é curioso observar como cada um desses países trata a questão da língua curda. Como destacamos, no Iraque ela é um dos idiomas oficiais. No Irã o uso da língua é aceito nas regiões onde prepondera essa etnia. Na Síria, o idioma curdo é proibido, não se aceitando seu ensino nas escolas e nem a veiculação pela mídia. Imagino que lá os pais curdos conversem com os filhos em sussurros, por detrás de cortinas fechadas. Finalmente, na Turquia, a questão tem se modificado ao longo dos tempos mais recentes. Por exemplo, em 2002 existiam diversas restrições, com a língua sendo proibida nas escolas e na mídia, mas de forma mais suave do que na Síria. Em 2006 o governo turco liberou o uso da língua curda em emissões de televisão, mas com o tempo máximo de 45 minutos diários. O mais curioso é que eram proibidos os desenhos animados dublados em curdo, em uma clara imposição restritiva às crianças. Em 2009 esta norma foi abrandada, dentro do quadro de um relaxamento progressivo nas limitações de uso da língua curda. Finalmente, em 2012, seu ensino foi liberado nas escolas públicas dos territórios de fala curda. Vamos ver se tal postura absurda no controle da utilização do idioma – que é uma legítima propriedade imaterial de seus usuários – possa chegar a um final feliz. Nesse aspecto, o mundo já deveria ter aprendido com os abusos do regime franquista na Espanha e com as rigorosas campanhas de russificação de territórios, levadas a cabo na época da antiga União Soviética.
A língua curda é do tipo ergativo (sujeito de verbo transitivo é declinado). Nela encontramos também o paucal, ou seja, um número usado para pequenas quantidades, à semelhança do dual que, em diversas línguas, indica dois objetos ou pessoas. O paucal é uma característica também do idioma servo-croata. Dentre as semelhanças entre o curdo e o persa, destaca-se a presença do ezafé, usado como partícula de ligação entre um nome e um adjetivo ou como indicação de posse. Exemplo: jégá-y-pāsā (palácio do rei, onde jégá é “palácio” e pāsā é “rei”).
A seguir apresentamos algumas expressões no dialeto curdo Kurmanji, que é o mais falado. Pronomes pessoais: ez, tu, ew (pronúncia “eu”), em, hun, ew. Numerais de 1 a 10: yek, du, sê, çar (o “ç” tem o som de “tch”), pênc, șeș, heft, heșt, neh, deh. De fato, os números são muito semelhantes na maioria das línguas túrquicas e iranianas. Silav (olá), Beyanibash (Bom dia), Oxir be (Até logo), Ez fam nakim (eu não entendo), Min biburine (Desculpe), Jè kerema xwe (Por favor), Ez te hes dikèm (Eu te amo) e Spas (obrigado; no dialeto Sorani é Sipas).
Origem de nomes dos meses do ano (4)
No Irã, que não é um país árabe, existem os nomes ocidentais, derivados especificamente do francês, os quais são usados em atividades comerciais, calendários esportivos, meios de transporte etc. e os nomes locais. No calendário persa tradicional o início do ano coincide com o início da primavera (20 de março) e termina com o começo do inverno (19 de março). Os primeiros meses possuem 31 dias, os cinco seguintes 30 dias e o último 29 dias.
Mesmo no continente europeu existem curiosas variações para os nomes de meses do ano. Na parte ocidental é seguida a nomenclatura genérica, derivada do latim. A situação começa a se complicar é quando entramos no mundo eslavo. Algumas das línguas eslavas, como croata, tcheco, polonês, ucraniano e bielorrusso apresentam os nomes dos meses em referência a atividades do homem ou da natureza. Assim existe, por exemplo, o mês das flores, que em polonês é abril e em tcheco é maio, mês da colheita e o mês da queda das folhas, com o belo nome de listopad. Só que essa palavra, que designa o mês de novembro em polonês, em croata é o nome para o mês de outubro.
Frase para sobremesa: 1) A razão por que um homem fala é ocultar seus pensamentos. 2) Um homem não é independente a menos que tenha a coragem de ficar sozinho (Halldór Laxness, 1902-98).
Bom descanso!