Lista dos melhores livros de todos os tempos (www.thegreatestbooks.org)
3. Dom Quixote (Don Quijote), Miguel de Cervantes (1547-1616)
Aclamado por críticos e leitores como um dos maiores livros da literatura universal, a obra El ingenioso hidalgo Don Quijote de la Mancha é considerada como sendo o primeiro romance moderno. Seu autor, Miguel de Cervantes e Saavedra, tornou-se o principal responsável pela estruturação do idioma castelhano, que passou a ser conhecido como a “língua de Cervantes”. Imagino que todos os nossos leitores já tenham se deliciado com as mirabolantes aventuras do fidalgo Dom Quixote e do seu fiel escudeiro Sancho Pança em terras espanholas. O livro, que foi publicado em duas partes, a primeira em 1605 e a segunda em 1615, é um tocante hino aos valores de coragem, amizade, devoção, fantasia e solidariedade. Nenhum leitor passa imune à grandeza do conteúdo desse fascinante romance de cavalaria. Curiosamente, o conhecido dramaturgo espanhol Lope da Vega (1562-1635), autor de mais de 1.500 peças de teatro, qualificou a obra como “muito fraca, de baixa qualidade”. Pobres mortais. A propósito, é conhecida a coincidência das datas de morte de duas das maiores estrelas da literatura, Shakespeare e Cervantes, ambos falecidos em 23/04/1616. Como as coisas na vida podem parecer simples, embora ocultem traços de complexidade, cabe lembrar que, nessa época, já era adotado no reino de Castela o calendário gregoriano, o qual só foi introduzido na Inglaterra em 1751. Desta forma, no rigor dos números, Shakespeare veio a falecer dez dias depois de Cervantes.
Como no caso de Proust (Post 112), a magnitude de uma obra-prima acaba abafando as outras produções literárias do mesmo autor. Em relação a Cervantes poderia ser lembrado, no máximo, um volume de contos intitulado “Novelas exemplares”. Ele chegou a redigir algumas poesias, que não caíram no gosto do leitor espanhol (talvez aí, e só nesse aspecto, Lope da Vega pudesse ter uma sombra de razão). Existem sete traduções brasileiras de Dom Quixote. A mais conhecida é o primoroso trabalho dos dois Viscondes, o de Castilhos e o de Azevedo, realizado para a edição portuguesa de 1876/78 e publicado no Brasil pela Editora Martin Claret em 1942/43. Não chegam a ser surpresa – pois isso ocorre em muitas traduções – as diferenças de palavras e construções na análise comparada dessas várias edições.
A língua turca
O idioma turco (türkçe) é o maior da família das línguas túrquicas, sendo falado por cerca de 85 milhões de pessoas. Houve uma discussão entre os linguistas – a qual ainda tem seus resquícios – se as línguas túrquicas não teriam uma origem comum nas línguas altaicas (em referência aos montes Altai, na Ásia Central), dada a semelhança no léxico e em estruturas gramaticais. Todavia, os estudos modernos refutam essa teoria. O turco é o idioma oficial na Turquia e no curioso “país” República Turca do Chipre do Norte. Desde 1983 a bela ilha mediterrânea de Chipre foi dividida, por contingências históricas, em dois setores, a parte sul, de fala grega, e a norte, de fala turca. Chipre é um membro da União Europeia, mas apenas na sua região grega, já que o território do norte é reconhecido como país independente por uma única nação, obviamente a Turquia. O turco é falado também por grupos populacionais em vários países vizinhos e, de forma destacada, na Alemanha, que abriga um contingente de dois milhões de turcos e seus descendentes. Após a Segunda Guerra Mundial, com a Alemanha em escombros, foi recrutada uma mão de obra internacional para ajudar na reconstrução do país. Esses trabalhadores eram designados como Gastarbeiter (trabalhadores convidados), dos quais a maior parcela era formada pelos turcos. Cabe ainda lembrar que a elevada população de curdos que vivem na Turquia (4,5 milhões) fala, além do turco, o idioma curdo, de origem iraniana, e que veremos em um Post futuro.
Os primeiros registros escritos do turco remontam ao ano 800. Antes da modernização do idioma, era empregado o chamado turco otomano, uma mistura de língua turca, persa e árabe. O Império Otomano, que teve vida longa (1299-1922), se encerrou com a destituição do sultão Mehmet VI. No ano seguinte foi proclamada a República da Turquia, liderada por Mustafá Kemal (1881-1938). Originalmente ele tinha o nome apenas de Mustafá, já que não era costume na época o uso de sobrenomes. Na escola primária, um professor lhe deu a alcunha de Kemal (perfeição) devido a seus dotes para a matemática. Depois de alçado à presidência seu nome se completou com o apêndice Atatürk (pai dos turcos). Kemal conduziu uma verdadeira revolução cultural no país, iniciada pela introdução de um alfabeto latino modificado no lugar do alfabeto árabe (1928). Ele próprio viajava às aldeias do interior para conclamar a população a se alfabetizar e a aprender o novo alfabeto. Kemal determinou o fechamento das escolas islâmicas e passou a educação para as mãos do Estado. Realizou várias reformas, dentre elas o direito das mulheres ao voto. À época, a maioria dos países europeus não havia ainda logrado tal avanço. A língua turca passou também por um processo de purificação, com a substituição de vocábulos de origem persa e árabe.
O idioma turco é aglutinante (palavras formadas pela união de morfemas), não possui gêneros nem artigos definidos. Um exemplo do caráter aglutinante do idioma é dado a seguir: ev (casa), eviniz (vossa casa), evinizde (na vossa casa), evinizdeyiz (nós estamos na vossa casa). Um exemplo ainda mais marcante é a palavra “obituário”, comum em seções de jornais: Bayramlaşamadιklarιmιz (“aqueles dentre vós com os quais não poderemos trocar votos de bom ano novo”). Quanto respeito e elegância. Nesta longa palavra há a presença do “ι” (letra i sem pingo), que soa como um “ê”. Outros acréscimos em relação ao alfabeto latino são a letra ǧ (sem som, apenas indica o alongamento da vogal precedente), o ç (som de “tch”), o ş (som de “sh”) e o c (som de “dj”). Desta forma o sobrenome “Curi”, frequente no Brasil, deve ser falado como “djuri”. A própria pessoa não irá entender, mas regras são regras.
O feminino de seres animados é construído mediante a inserção da palavra kadin. Assim: kahraman (herói), kahraman kadin (heroína). A sílaba tônica é a última, com exceção para os nomes de lugares. Portanto, İstambul é pronunciado como “Istánbul”. Vejam que o “i” maiúsculo inicial, ao contrário das outras línguas, recebe o pingo sobre a letra.
Os pronomes pessoais são: ben, sen, o, biz, siz, onlar. Observa-se que, na terceira pessoa do singular e do plural, não há distinção de gênero, como temos no ele/ela ou eles/elas. No uso do pronome “o”, por exemplo só entenderemos se se trata de homem ou mulher pelo contexto da frase (difícil, não?). Numerais: bir, iki, üç, dört, beş, altι, yedi, sekiz, dokuz, on. Dias da semana: Pazartesi, Salι, Çarşamba, Perşembe, Cuma, Cumartesi, Pazar. Algumas expressões: Merhaba (Olá), Güle güle (até logo), Günaydιn (Bom dia), Anlamιyorum (Não entendo), İzninizle (desculpe), Lütfen (Por favor), Seni seviyorum (Eu te amo), Teşekkür ederim (Obrigado).
Com a apresentação do idioma turco terminamos a abordagem das principais línguas europeias. Foram descritas as características de 78 idiomas. Como indicado, apenas oito deles não pertencem à família indo-europeia: finlandês, húngaro e estoniano (todos da família fino-úgrica), georgiano (família caucasiana), maltês (família semítica), turco e azeri (família túrquica) e basco (família independente). Nossa viagem parte agora para o continente asiático, onde prosseguiremos, inicialmente, com a apreciação de outras línguas da família túrquica.
Palavras originárias de nomes de pessoas (1)
Abreugrafia: método de fixar imagens em chapa fotográfica (do médico paulista Manuel de Abreu, 1894-1962).
Algarismo: do sábio e matemático persa Mohamed ibn Musa al-Khwarizm (780-850).
América: do navegador italiano Américo Vespúcio (1454-1512).
Atlas, Atlântico: homenagem a Atlas, deus grego que sustentava as colunas do céu.
Baderna: desordem, confusão (de Marieta Baderna, 1828-92, dançarina italiana que causou furor quando esteve no Rio de Janeiro em 1851 e ali se radicou).
Balzaquiana: em geral, mulheres com mais de 30 anos de idade, retratadas nas obras do escritor francês Honoré de Balzac (1799-1850).
Baquelita: tipo de resina, criada pelo químico belga Leo Hendrix Baekeland (1863-1944).
Benjamim: filho mais jovem (na Bíblia o filho mais moço de Jacó).
Frase para sobremesa: A linguagem deve ressoar com todas as harmonias da música. O escritor deve sempre, em todos os momentos, encontrar a palavra trêmula que capta a coisa e é capaz de desenhar um soluço da minha alma (Knut Hamsun, 1859-1952).
Até a próxima!