Escritores que ganharam o Prêmio Nobel de Literatura.
2009: Herta Müller (1953-): A escritora romena-alemã nasceu no sudoeste da Romênia, em uma minoria de fala alemã dentro do país. O pai foi membro da SS alemã (unidade de elite do partido nazista) durante a Segunda Guerra Mundial, trabalhando depois como motorista de caminhão. A mãe, aos 17 anos de idade foi deportada para campos de trabalhos forçados na União Soviética, juntamente com outros 100.000 romenos. Cinco anos depois foi libertada, retornou ao país, casou-se e teve a filha Herta. Como o alemão era a sua língua materna, Herta aprendeu o idioma romeno apenas na escola. Graduou-se em Literatura Romena pela universidade de Timișoara (pronúncia:Timichoara), a terceira maior cidade do país. Em seguida, de 1976 a 79, trabalhou como tradutora em uma empresa de construção pesada, sendo demitida por se recusar a cooperar com a Securitate, a temida polícia secreta do país. A partir desta data, Herta começou a dar aulas privadas de alemão para obter alguma fonte de renda. Seu pedido de emigração feito em 1985 foi recusado. Dois anos depois, já casada com o escritor Richard Wagner, também vinculado à minoria alemã na Romênia, foram autorizados a se mudarem para Berlim, onde ela vive até hoje. O marido, que estava separado de Herta, faleceu em 2023. Ela voltou a se casar, desta vez com o dramaturgo alemão Harry Merkle.
Herta sempre foi uma ativista política. Na Romênia, apesar de todas as limitações da censura, ele tentava mostrar ao mundo os horrores de uma das ditaduras mais sanguinárias do planeta, sem nenhum paralelo no âmbito dos outros países comunistas. O presidente Nicolae Ceaușescu (1918-1989) governava o país mediante a execução sumária dos seus eventuais oponentes. Na Revolução Romena de 1989 ele foi preso pelo próprio exército que comandava, sendo condenado e fuzilado na noite de Natal. Pior ainda era seu segundo filho, Nicu, acusado de reiterados estupros e sequestros e de incontáveis atropelamentos por conduzir o veículo embriagado. Ele morreu por cirrose hepática aos 45 anos em um hospital de Viena. Herta nas suas entrevistas, comentava sobre como o planeta podia abrigar um ser humano tão deplorável.
Seu primeiro livro Niederungen, escrito em alemão, que aborda a vida de uma criança de minoria alemã, foi publicado na Romênia em 1982. Naturalmente a produção literária de Herta teve um grande impulso a partir de sua mudança para a Alemanha, onde encontrava editores à altura da qualidade dos seus trabalhos. Até o momento (2023), oito de seus mais de 20 livros foram publicados em português. É curioso observar como variam os títulos das obras no português do Brasil e de Portugal. Já comentamos isso em um Post anterior, o que vale também para o nome de filmes. Por exemplo a obra de 1992, Der Fuchs war damals schon der Jäger, foi traduzido no Brasil como “A raposa já era o caçador” e em Portugal “Já então a raposa era o caçador”, com esse agradável tempero lusitano na ordenação das palavras. O livro de 1996, Herztier (literalmente seria “animal do coração”) foi chamado no Brasil de “Fera d’alma” e em Portugal “A terra das ameixas verdes”. Esta obra foi escrita após o assassinato de dois amigos romenos. Em 1997 foi lançado Heute wär ich mir lieber nicht begegnet, traduzido no Brasil como “O compromisso” e em Portugal “Hoje preferia não me ter encontrado”. A propósito, os títulos dos livros de Herta Müller são sempre muito curiosos, como seu primeiro romance publicado na Alemanha, em 1986: Der Mensch ist ein grosser Fasan auf der Welt, em tradução literal “O homem é um grande faisão no mundo”. Contudo, sua produção de maior impacto na crítica e no público veio em 2009, no mesmo ano em que ganhou o Nobel: Atemschaukel (literalmente “Balanço da respiração”) que no Brasil recebeu o título de “Tudo que tenho levo comigo” e em Portugal “Tudo que tenho trago comigo”, o que permite um fascinante cotejamento dos ambíguos significados dos verbos “levar” e “trazer”. Esta obra-prima descreve a vida de um jovem transportado para um campo de concentração soviético, da mesma forma como ocorrera com a mãe da autora. Herta recebeu alguns dos mais destacados prêmios literários da Europa, o que leva a entender (eu nunca diria traz a entender) que o Nobel não passou de mais uma etapa, sem dúvida a maior, de sua vitoriosa carreira literária.
A língua ucraniana
O idioma ucraniano (українська мова- ukrayinska mova) pertence ao grupo oriental das línguas eslavas. Ele é falado por aproximadamente 30 milhões de pessoas na Ucrânia e mais 10 milhões nos países vizinhos e naqueles que receberam ondas migratórias de ucranianos. No Brasil estima-se que de 500 a 600 mil pessoas falem a língua, constituindo a maior comunidade de descendentes de ucranianos na América Latina. A maioria dessas pessoas vive no estado do Paraná. Somente na cidade de Prudentópolis, na região central do estado, avalia-se que cerca de 75% da população seja de origem ucraniana. Uma das escritoras mais conhecidas do país, Clarice Lispector (1920-77) era natural da Ucrânia, mas de lá saiu com pouco mais de um ano de idade, quando a família emigrou para o Brasil. Conforme suas próprias palavras, “eu, literalmente, nunca pisei no solo ucraniano, fui sempre carregada no colo”. Assim como a maioria das línguas eslavas, também o ucraniano evoluiu da linguagem religiosa do antigo eslavônico. No século XII a Rússia de Kiev (antiga origem do império russo) se desintegrou em vários territórios. No século XIV o Grão-Principado da Lituânia anexou grande parte da atual Ucrânia. Três séculos depois ocorreu a luta de emancipação contra o Grão-Ducado, a qual terminou com a unificação da Ucrânia com a Rússia. Na época o país era conhecido como “Rússia pequena”. Em 1939, por força de acordos de guerra, a Ucrânia Ocidental, com territórios que pertenciam à Tchecoslováquia, Polônia e Romênia, foi incorporada à União Soviética. A Ucrânia, assim como todas as antigas repúblicas soviéticas, se tornou independente com a fragmentação da União Soviética em 1991.
Este contexto histórico fez com que o idioma ucraniano sofresse a forte influência da língua russa e, principalmente da polonesa, tanto na estrutura gramatical quanto na formação do vocabulário. No aspecto de compreensão ela é parcialmente inteligível com falantes do polonês e bastante inteligível com o bielorrusso, mais do que com o russo. A língua ucraniana foi reestruturada no início do século XIX conforme o dialeto de Kiev. No período de 1863 a 1905 ocorreu a política czarista de unificação das línguas eslavas. Por consequência as publicações em ucraniano e bielorrusso foram censuradas. A situação piorou a partir de 1929 com o intenso processo de russificação de todas as repúblicas. O maior escritor ucraniano, Mikhail Bulgákov, se viu na contingência de escrever seus romances em russo. Sua obra-prima “O Mestre e Margarida” (Máster i Margarita), com presença frequente nas listas de melhores livros da história, foi escrita em quatro versões sucessivas. Após a morte de Bulgákov, sua esposa completou a narrativa dos capítulos faltantes. Este livro, pleno de alegorias e transbordante de um realismo fantástico, relata a visita do Diabo à cidade de Moscou. Em Portugal a versão levou o título de “Margarita e o Mestre”. Se vocês me perguntarem o motivo dessa inversão de nomes, minha mais legítima resposta é “não sei”. Na situação atual na Ucrânia, muito divulgada em função da persistente guerra, é que apenas 40% da população utiliza em primeiro lugar a língua ucraniana. Na verdade, são quase todos bilíngues, mas as tradições familiares e posturas políticas levam à preferência de um ou de outro idioma.
O alfabeto ucraniano é ligeiramente diferente do alfabeto russo. No ucraniano existem letras adicionais, ao exemplo de Ґ (pronúncia de “g”), і (“i”) e Ї (letra i com dois pingos, som de “ií”). Além dos seis casos vistos na língua russa (Posts 92 e 93), o ucraniano conta o caso vocativo (chamamento ou interpelação no discurso direto, por exemplo João, faça o dever de casa), que é, portanto, declinável. Dentre as línguas eslavas, este caso não aparece no russo, bielorrusso, eslováquio e eslovênio. Como a maioria dos idiomas eslavos (à exceção do búlgaro e do macedônio), também no ucraniano não existem artigos. Os aspectos (imperfeito: ações rotineiras e perfeito: ações pontuais), já vistos nos Posts sobre a língua russa, os quais tanta dificuldade trazem para os não nativos, estão firmemente presentes no ucraniano. Na fonética, ao contrário do russo, a letra “o” sempre tem o mesmo som.
Pronomes pessoais: я (ia), ти (ty), вiн (vin)/вона (vona), ми (my), ви (vy), вони (voni). Números de 1 a 10: один (odin), два (dva), три (tri), чотири (tchotiri), пять (piat), шість (chist), сим (sim), вісім (visim), девять (deviat), десять (deciat). Dias da semana: понеділок (ponedílok), вівторок (vivtórok), середа (seredá), четверг (tietvierg), лятніца (piatnitsa), субота (subota), неділя (nedilia – completamente distinto do russo, no qual essa palavra significa semana). Algumas expressões: Olá (привіт – privit), Bom dia (доброго ранкун- dobrovo ranku), Até logo (до побачення – do pobatchenia), Não entendo (я не розумію – ia ne rozumiu), Desculpe (вибачте – vibatchte), Por favor (будб ласка – bud lasca), Obrigado (дякую – diákuiu), Eu te amo (я тебе люблю – ia tebie liubliu – idêntico ao russo).
Origem de nomes comerciais ligados à moda, joias e perfumes (4)
Hermès: indústria da moda, originalmente iniciada como uma empresa de selas para cavalos. Seu criador foi Thierry Hermès (1801-78), nascido na Alemanha, à época pertencente ao Império Napoleônico.
Karl Lagerfeld: estilista alemão (1933-2019).
Kenneth Cole: empresário norte-americano, nascido em 1954, que fundou a casa de moda em 1982
Kenzo: criada pelo designer de moda japonês Kenzo Takada (1939-2020).
Lacoste: grifefundada pelo tenista francês Jean René de Lacoste (1904-96). Apelidado de “crocodilo”, devido ao seu empenho em ganhar as partidas, ele levou o símbolo para fazer parte dos produtos.
Lancôme: a marca foi criada em 1935 pelo perfumista francês Armand Petitjean, homenageando a floresta de Lancosme, situada no vale do rio Indre, parte central da França, conhecida pelas belas rosas da região.
L’Oréal: empresa fabricante de cosméticos, foi fundada em 1909 pelo engenheiro químico francês Eugène Schueller (1881-1957). O primeiro produto fabricado foi uma tintura de cabelos para mulheres, a qual “transformava seu rosto como se ele tivesse uma auréola (aureale em francês)”. Por questões de sonoridade, o nome foi alterado para L’Oréal.
Frase para sobremesa: Herta e a vida: Você sai para um passeio e o mundo se abre. E antes que você tenha esticado as pernas apropriadamente, ele se fecha. Daí em diante tudo é apenas iluminado por uma lanterna. E eles chamam a isso ter vivido. Nem vale a pena o trabalho de calçar os sapatos.
Bom descanso!