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Escritores que ganharam o Prêmio Nobel de Literatura.

1987: Joseph Brodsky (1940-96): Escritor russo, naturalizado norte-americano, Brodsky nasceu na cidade de Leningrado (atual São Petersburgo), originário de uma família judia. Seu pai era fotógrafo e a mãe trabalhava como intérprete. Na sua primeira infância conseguiu sobreviver ao Cerco de Leningrado, um dos episódios mais infames e cruéis da Segunda Guerra Mundial: as tropas nazistas estabeleceram um bloqueio à cidade, impossibilitando a chegada de alimentos, água tratada e carvão para aquecimento. A orientação dada por Hitler era de que “se deixasse perecer de fome a gente que morava na mais bela cidade da Rússia”. O cerco durou 872 dias (08/09/1941 a 21/01/1944), fazendo com que mais de um milhão de pessoas morressem por inanição e doenças. Brodsky perdeu vários parentes, mas ele e os pais lograram sobreviver, todavia marcados para sempre com graves problemas de saúde. Apenas no apogeu do inverno, quando o vizinho lago Ladoga (o maior da Europa) se congelava, alguns caminhões russos utilizavam o único acesso possível à cidade, levando mantimentos e remédios. Na fase mais crítica do cerco morriam cerca de 20.000 pessoas por dia, ocorrendo frequentes episódios de canibalismo e de assassinatos com esse objetivo. Desde criança Brodsky se mostrou como sendo uma pessoa rebelde, o que iria se confirmar ao longo de sua vida. Por vontade própria abandonou a escola aos 15 anos, passando a trabalhar como operador de máquinas de moagem e, em seguida, auxiliar em um necrotério. Ele argumentava que, como queria ser médico, era importante que conhecesse a fundo a anatomia humana. 

Em 1955 começou a escrever seus primeiros poemas e em 1958 já era conhecido em Leningrado como um talentoso poeta. Na verdade, foram os poemas, e não a prosa, que consagraram sua fama de escritor. Todavia, em 1963, suas obras começaram a ser censuradas, sob a alegação de pornografia e de propaganda antissoviética. No ano seguinte, em um julgamento sumário, Brodsky foi acusado de “´parasitismo social”, sendo condenado a cinco anos de trabalhos forçados no Ártico, extremo norte da Rússia. Curiosamente, ele descreveu esse período como sendo um dos melhores de sua vida, já que morava sozinho em uma casa (um enorme luxo para os russos da época), tinha um intenso contato com a natureza, se exercitava cortando lenha e ingeria uma alimentação saudável. Como fruto de pressão exercida por intelectuais europeus, dentre eles Jean-Paul Sartre, recém-premiado com o Nobel de Literatura em 1964, no ano seguinte a punição de Brodsky foi encerrada. No entanto, ele continuou atormentando as autoridades soviéticas com sua poesia, ao mesmo tempo lírica e politizada. Em 1971 o ainda jovem poeta (com 31 anos) foi convidado pelo governo comunista a emigrar para Israel. Como essa não era sua intenção, Brodsky simplesmente recusou. As autoridades continuaram “recomendando fortemente que ele deixasse o país”. Até que, em 1972, foi colocado à força em um avião, podendo levar apenas uma pequena mala (onde colocou livros, poucas roupas e duas garrafas de vodca), e despachado para um local desconhecido. Só ao sobrevoar a Áustria ele se deu conta de que seu destino seria a cidade de Viena. Com a ajuda de amigos, pois já era um intelectual conhecido no meio literário, partiu para a Inglaterra e logo depois emigrou para os EUA. Brodsky nunca mais retornou à Rússia, mesmo tendo sido convidado pelo governo nos anos 90.

Nos EUA foi professor de renomadas universidades, dentre elas Yale, Cambridge (a norte-americana, não a inglesa), Michigan e Columbia. No ano de 1979 Brodsky passou uma semana no Rio de Janeiro, como convidado para o Congresso do Pen Club International, à época presidido pelo escritor peruano Mario Vargas Llosa, prêmio Nobel de Literatura em 2010. Brodsky escreveu que não achou a cidade tão bonita quanto diziam, criticou a lentidão do trânsito e a gritaria nas ruas. Além disso, teve seu relógio roubado na praia. Coisas da vida. Em 1986, um ano antes de receber o Nobel, Brodsky foi agraciado com o National Book Critics Circle Award pelo seu livro Less than one (“Menos que um”), uma vibrante obra autobiográfica, plena de humor e sensibilidade. Neste livro ele sugere que os dirigentes de uma nação sejam escolhidos não pelo voto, mas pela quantidade e qualidade dos livros que leram. A ideia, de fato, não é ruim. Brosdky faleceu, nos EUA, de um ataque cardíaco quando tinha apenas 55 anos. Seu corpo foi trasladado para a ala protestante do cemitério na Isola di San Michele em Veneza, cidade que ele visitava quase todos os anos, sempre na época do inverno.         

A língua romena (2)

O “dialeto” moldavo, embora seja perfeitamente compreensível para os romenos, possui grande número de empréstimos do russo, principalmente na linguagem informal. Todavia, não podemos fechar este parágrafo sem fazermos menção à região moldávia da Transnístria (etimologia: além do rio Dniester). Trata-se de território que se autodeclarou independente em 1990, com o inequívoco apoio da Rússia, a qual, apesar de manter um consulado na capital Tiraspol, não referenda a autonomia da Transnístria, preferindo enquadrá-la na categoria de “status especial”, seja lá o que isso signifique. Nenhum país da ONU reconhece a separação da Transnístria (ao contrário do que, como vimos, ocorreu com Kosovo). Obviamente o idioma romeno na Transnístria (cujo nome local é Pridnestrovie) é escrito no alfabeto cirílico. O russo e o ucraniano também são idiomas oficiais na região. Esta fatia da Moldávia, que cunha sua própria moeda, teve uma boa divulgação graças à força comunicativa do futebol: a principal equipe do território, o FC Sheriff Tiraspol, conseguiu resultados expressivos (2021-23) na Liga dos Campeões da Europa. Destaca-se que o dialeto moldavo guarda fortes semelhanças com a variante do romeno falado na região da Transilvânia (do latim medieval terra ultra silvam, “terra além da floresta”), origem do famigerado Conde Drácula (Vlad Drăculea), 1431-76, imortalizado no famoso romance do escritor irlandês Bram Stoker (1847-1912).

A posição geográfica da Romênia na região dos Bálcãs provocou a incorporação de grande número de palavras estrangeiras, oriundas do húngaro, de línguas eslavas, do grego e do alemão. Assim, por exemplo, como não existia a palavra “sim” em latim (nesse idioma, a resposta afirmativa costumava repetir o verbo na pergunta ou então se empregava o termo sic, “assim”, de onde se originou nosso sim ou o espanhol si), a língua romena tomou dos idiomas eslavos a curtíssima palavra da para representar o termo “sim”. Talvez em nenhuma língua do planeta essa palavrinha seja representada por termos longos, pois seria um absoluto contrassenso. A palavra para cidade é oraş (vinda dohúngaro város). Outros estrangeirismos: “coração” é inimă, derivado do latim anima. “Batata” é cartof,  vindo do alemão Kartoffel. Já que encontramos poucas linhas acima um dos diacríticos (sinais gráficos complementares) do romeno, que é a letra “S” com um rabinho inferior, semelhante a uma virgula, vamos comentar um pouco sobre a fonética do romeno: “ş”, é lido como “sh”, como por exemplo do nome do ditador Nicolai Ceauşescu (pronúncia “tcheaushescu), que governou a Romênia de 1957 a 89, de triste memória como um dos mais sanguinários líderes europeus. Já o “t” com o rabinho (ţ) tem o som de “ts”, muito frequente no romeno, equivalente ao “z” do italiano. Aliás, a expressão verbal do idioma, incluindo sua musicalidade, lembra muito aquela da língua italiana. Um exemplo que é falado e escutado todos os dias: Bună dimineaţa (bom dia). Aproveitando esse exemplo, temos aqui a letra “ă”, que equivale a um suave “o” fechado ou “ô”. Por outro lado, o â (“a” com acento circunflexo) é pronunciado aproximadamente como “ê”, conferindo um som anasalado à sílaba seguinte. Assim: câine (cão).  Logicamente essas informações teóricas não são capazes de refletir as nuances vocálicas de um falante nativo. Outro exemplo: na palavra para “chá” (ceai), a letra “e” não é pronunciada (pronúncia: tchai), servindo apenas como um sinal de palatalização, ou seja, a língua toca o céu da boca (palato) na verbalização do termo. O romeno apresenta também o rotacismo, existente em muitas línguas românicas, que é a troca de um som pelo “r” (“rô” em grego, daí rotacismo), como temos na migração do latim (flos) para o português flor. No romeno a palavra para céu é cer, vinda do latim cælum. É frequente também a perda do “L” intervocálico. Assim: do latim stella veio o romeno stea (estrela).

Algumas particularidades: o romeno é o único idioma românico que possui declinações, como no latim, ou seja, o final dos nomes, adjetivos e pronomes recebe acréscimos conforme os diversos casos (nominativo, acusativo, dativo, genitivo e vocativo). Também, à semelhança do latim, o romeno tem o gênero neutro (além, naturalmente, do masculino e feminino). E a lista continua. Dentre as línguas românicas só o romeno apresenta o artigo definido enclítico, vale dizer, aposto ao final da palavra. Assim: cal (cavalo), calul (o cavalo); loc (lugar), locul (o lugar). Tal característica também existe nos idiomas escandinavos, além do búlgaro e do albanês, que são línguas indo-europeias, mas não românicas. No nosso português e em todas as outras línguas românicas o artigo definido é proclítico, isto é, vem antes do nome. Também o romeno é o único idioma românico em que a letra “h” consiste em um fonema, ou seja, é pronunciada. No romeno não existem orações infinitivas, isto é, com o verbo no infinitivo. Assim a frase “ele se esforça para vencer” é construída como “ele se esforça para que vença.” Um traço curioso é a existência, em romeno, de um equivalente muito próximo da nossa bela palavra “saudade”. É voz comum que só o idioma português possui tal expressão, já que, nas outras línguas, o significado não é o mesmo, se aproximando mais de uma “vontade de retorno ao lar” e não refletindo a “dor da ausência”. Pois o romeno tem o substantivo durere, que corresponde exatamente à nossa ‘saudade.” 

Vamos a algumas frases e expressões em romeno: Salut (olá), Ce faci (como vai?), La revedere (até logo), Vă rog (por favor), Mulţumesc ou Merci (obrigado), Scuzati-mă (desculpe), Nu inţeleg (não entendo), Te iubesc (eu te amo). Pronomes pessoais: eu (não fiquem tão felizes, pois a pronúncia é “ieu”), tu, el/ea, noi, voi, el/ele. Números de 1 a 10: un, doi, trei, patru, cinci, şase, şapte, opt, nouă, zece. Dias da semana: luni, marţi, miercuri, joi, vineri, sîmbătă, dominică.     

Curiosidades

A maioria de nossos leitores certamente se recorda da cantiga de infância “Escravos de Jó”: Os escravos de Jó jogavam caxangá (jogo de tabuleiro), tira, põe, deixa o zambelê ficar, guerreiros com guerreiros fazem ziguezigue zá….. Temos aqui duas palavras originárias do quimbundo (língua falada na região de Angola), de onde deriva uma parcela razoável de nosso léxico: e zambelê.  A primeira designa os escravos domésticos (de njó, casa) e a segunda indica o escravo de um senhor.  

O maior cemitério do estado do Rio de Janeiro é o de São Francisco Xavier, localizado na capital. Ele é mais conhecido como Cemitério do Caju, por se localizar no bairro homônimo. Até aí nada de especial. Mas, que Caju é esse? Aqui não se trata da fruta, mas sim de uma “casinha” (do quimbundo kanjo). Já a fruta tem origem no tupi aka’yu, que significa “anos de idade”, provavelmente devido à contagem de tempo relativa à frutificação do caju.  

Frase para sobremesa: Não poderíamos deixar de homenagear a criatividade de Brodsky: 1) Talvez a maior prova da existência do Todo Poderoso seja nunca sabermos quando vamos morrer. 2) A vida – da forma como realmente é – não consiste em uma batalha entre o bem e o mal, mas entre o mau e o pior.

Até a próxima!

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