Post-71

Escritores que ganharam o Prêmio Nobel de Literatura.

1986: Wole Soyinka (1934-): Foi o primeiro africano a receber o Nobel, em premiação ocorrida há 37 anos (situação em 2023), ou seja, Soyinka está no caminho para quebrar o recorde de anos de longevidade após a concessão do laurel, o qual ainda é do islandês Halldór Laxness, premiado em 1955, e que dormiu por longos 43 anos tendo os sonhos embalados pela satisfação de ser um dos contemplados pelo Prêmio Maior. A concessão do prêmio a Soyinka não pegou o mundo de surpresa, dado que ele já era reconhecido como um dos maiores dramaturgos da atualidade, ela apenas confirmou essa condição.

Nascido de família humilde em região da Nigéria com predomínio da etnia iorubá, Soyinka cumpriu os estudos universitários na Universidade de Ibadan, partindo em seguida para o primeiro grande salto em sua vida: estudar Literatura na universidade de Leeds (Inglaterra), recebendo uma bolsa de estudos. À época a Nigéria ainda era uma colônia do Reino Unido, tendo obtido a independência em 1960 e passando a ser uma república em 1963. Em 1966 houve um golpe militar (dos tantos que já mancharam a história do país mais populoso do continente africano), seguido de um contragolpe. Assim, quem perdia, ganhou e logo voltou a perder. Soyinka, que sempre demonstrou um marcante envolvimento político em relação ao seu país, acompanhava de longe todos esses desdobramentos. Enquanto isso trabalhava como dramaturgo no Royal Court Theatre em Londres. Embora Soyinka possa ser considerado como um escritor completo, escrevendo poesias, romances e ensaios, foi na dramaturgia onde atingiu o maior destaque. Suas peças de teatro (onde ele muitas vezes atuava como ator), sempre pintadas com tintas revolucionárias, são encenadas em todo o mundo. Ao retornar à Nigéria, em 1967, foi preso por quase dois anos, a maior parte desse período passada em confinamento solitário. As razões para a detenção são óbvias, aliás, nem se precisaria de alegações para a prisão de alguém como ele.      

Em 1965 Soyinka publica o romance The interpreters, o qual aborda a vida de um grupo de jovens intelectuais nigerianos. Em 1967 publica, no país vizinho de Gana, sua primeira peça teatral de sucesso, The lion and the jewel, cuja tradução (O leão e a joia) foi a primeira edição do autor no Brasil, no tardio ano de 2012. A obra relata a disputa pelo amor de uma jovem entre um líder de aldeia e um professor. Durante as décadas seguintes Soyinka se dedicou quase que integralmente à dramaturgia, com exceção da novela Season of anomy 1973(anomia é um sinônimo de anarquia), na qual ele descreve suas reflexões enquanto prisioneiro. Um novo romance só viria a lume quase 50 anos depois, em 2021: Chronicles from the land of the happiest people on Earth (Crônicas do lugar do povo mais feliz da terra), um denso relato sobre a venda de órgãos humanos para rituais. Em 1970 é lançado o filme Kongi’s Harvest, no qual Soyinka, além de escrever o roteiro, faz também o papel de um ditador. A película foi dirigida pelo conhecido ator negro norte-americano Ossie Davis (1917-2005). Um outro filme com roteiro de Soyinka foi a adaptação para as telas de sua peça teatral Death and the King’s Horseman, tendo sido a primeira produção em língua iorubá a participar de um festival de renome (Toronto International Film Festival, 2022). Sua última grande obra literária foi o livro autobiográfico You must set forth at dawn (em tradução livre: “Você tem de partir bem cedinho”), uma pungente descrição da movimentada vida do revolucionário Soyinka.

Durante a ditadura de Sani Abacha na Nigéria (1993-8), Soyinka fugiu do país pela fronteira com o Benin e se exilou nos EUA até 1999. Nesse período lecionou em diversas universidades norte-americanas. Em 2012 ele esteve na 1. Bienal do Livro no Brasil. Casado por três vezes, tendo oito filhos, Soyinka continuou sua trajetória de professor visitante em universidades como Cambridge, Oxford, Harvard e Yale. Devido à movimentada agenda de viagens, sua última esposa o qualificou como sendo um marido visitante.     

A língua romena (1)

O idioma romeno pertence ao grupo itálico das línguas românicas, ou seja, aquelas derivadas do latim. Como não há nenhuma possibilidade prática de que uma nova língua românica surja repentinamente nos anais dos estudos filológicos, encerraremos nesse Post a apresentação dos simpáticos idiomas românicos, trazendo informações sobre a bela e sonora língua romena (limba română), a qual é falada por aproximadamente 24 a 26 milhões de pessoas. A grande maioria dos seus usuários são, obviamente, os cidadãos e moradores da Romênia e Moldávia, um país vizinho ao primeiro. No entanto, o romeno é também umas das cinco línguas oficiais na província autônoma (desde 1992) de Voivodina, situada na região norte da Sérvia. Esta província, que abriga 26 etnias, tem como capital Novi Sad, a segunda maior cidade do país, depois de Belgrado. As outras línguas oficiais na Voivodina são, naturalmente, o próprio sérvio, o croata, o húngaro e o eslovaco. A Sérvia possuía ainda uma segunda região autônoma – com a maioria da população de origem albanesa – que é a de Kosovo, a qual, no entanto, se declarou independente em 2008, recebendo o reconhecimento de metade dos países do mundo, com os números chegando a mais de 80% para as nações da União Europeia. O Brasil, muito cauteloso nas relações diplomáticas, ainda não entrou nessa lista.  O romeno é também uma das cinco línguas aprovadas para os serviços religiosos em Monte Athos, uma região autônoma do Estado Grego, patrimônio mundial da UNESCO, contando com 20 mosteiros e cerca de 1.200 habitantes. O acesso a esse território só pode ser feito por barco. Por se tratar de população de monges, não é permitida a entrada de mulheres nem de animais do sexo feminino (!?√∫!).

Os primeiros habitantes da região onde se localiza a Romênia foram os dácios, os quais utilizavam uma língua indo-europeia já extinta, existindo a suposição de que ela fosse muito semelhante ao latim. Não vamos confundir a Dácia com a Trácia, essa última sendo uma região histórica do sudeste da Europa, onde hoje se situam Bulgária, Grécia e Turquia. Existe a teoria de que os albaneses, que possuem uma língua indo-europeia, mas não românica, foram, na verdade, dácios que migraram para o Sul. Após a conquista da Dácia pelos romanos, onde ficaram do século II ao III, o latim vulgar foi sendo introduzido na colônia. Contudo, com a retirada dos romanos e devido ao isolamento geográfico nas regiões montanhosas da Dácia, uma nova língua foi surgindo, com a gramática muito similar à do latim. Considera-se que o romeno tenha sido o primeiro idioma neolatino a ser criado e ainda o único, dentre as línguas românicas, a manter as diversas declinações e o uso do gênero neutro. O primeiro exemplar de escrita romena data do século VI. A partir de 1521 o romeno passou a ser escrito com o alfabeto cirílico, o que durou até meados do século XIX. A primeira regulamentação da ortografia com o uso do alfabeto latino foi em 1860.

Existem quatro dialetos do romeno:

  • Daco-romeno, utilizado na Romênia;
  • Aromeno, falado em parte da Grécia, Sérvia e Macedônia do Norte;
  • Megleno-romeno, falado no norte da Grécia;
  • Istro-romeno, praticado na península da Istria, atualmente situada no território croata.

O romeno é falado também nos países que receberam ondas de imigrantes, como é o caso dos EUA e de regiões da América Latina. Estima-se que, no Brasil, existam aproximadamente 4 mil falantes do romeno.

Cabe ainda uma complementação – que não é tão simples quanto parece – em relação à Moldávia, que foi, até 1991, uma das repúblicas soviéticas. Antes de sua independência, o romeno falado na Moldávia era escrito no alfabeto cirílico. Em termos linguísticos, o romeno e o moldavo constituem o mesmo idioma. No entanto, no aspecto político, a Moldávia independente fazia questão de nomear o idioma moldavo como sendo o oficial do país. Agora, muito recentemente (março de 2023), a Constituição da Moldávia foi alterada, designando como “romena” a língua oficial do país. Prevaleceu o bom-senso.

Para quem nunca ouviu falar da Moldávia, pois é o país menos visitado da Europa e um dos cinco menos visitados do mundo – apesar de ter a maior adega subterrânea de vinhos do planeta – cabe uma breve menção à música “Festa no apê”, gravada pelo compositor brasileiro Latino (o nome até combina com esse Post) em 2004. O original dessa melodia, denominada Dragostea Din Tei (Amor de Tília), que alcançou um retumbante sucesso em todo o mundo, é da banda moldávia O-zone.     

(continua no próximo Post)

Etimologia de alguns elementos químicos (3)

Molibdênio (gr. mólybdos, chumbo, pela semelhança dos dois elementos), prata (lat. plattus, plano, placa de metal; o nome mais frequente em outras línguas é derivado do latim argentum, dinheiro, de onde vem o termo francês argent) e que é a origem do símbolo químico da prata, Ag; o nome do país Argentina está relacionado à presença de prata, que dá inclusive nome à bacia do Prata), cádmio (gr. kadmeia, terra, por sua vez derivado do topônimo Cadmo, região da Grécia), potássio (ing. potash, do lat. pottus, cinza de panela, e também vaso de beber, pote), cálcio (lat. calcium, pedra calcária), estanho (lat. stagnum), antimônio (gr. anti-monos, aquele que não aparece sozinho, expressão derivada da facilidade de complexação química deste elemento; seu símbolo Sb é proveniente do latim stibium), iodo (gr. iodes, violeta), ouro (lat. aurum), mercúrio (em homenagem a Mercúrio, deus dos viajantes, em alusão à alta mobilidade deste metal; seu símbolo químico Hg é proveniente do nome grego hidrárgyros, prata líquida).       

Frase para sobremesa: Duas frases que bem revelam o estilo combativo de Soyinka: 1) A maior ameaça à liberdade é a ausência de críticas. 2) Os livros e todas as formas de escrita são um terror para aqueles que desejam suprimir a verdade.

Bom descanso!

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