Escritores que ganharam o Prêmio Nobel de Literatura.
1975: Eugênio Montale (1896-1981); um dos mais conhecidos poetas italianos, Montale pertence ao grupo dos chamados “poetas herméticos.” E o que seria isso? Confesso que a explicação também é um pouco hermética: texto minimalista, ausência de artigos, imagens oníricas, eliminação da métrica e da rima. Na Itália esse movimento surgiu como artifício para burlar a rígida censura do governo fascista. Montale foi o sexto filho de uma família de comerciantes de produtos químicos em Gênova. Na infância teve de interromper os estudos por problemas de saúde (vocês já observaram como é elevado o número de laureados com o Nobel que tiveram infâncias difíceis?). Era sua irmã quem cuidava do garoto e, mais ainda, o orientava nas leituras. Como ele pensava em ser cantor de ópera (barítono), começou a ter aulas de canto na adolescência. Em 1917 Montale entrou para o exército e participou da Primeira Guerra Mundial. Alguns anos depois (1922) publicou uma coleção de poemas em uma revista literária. Mas foi no ano da graça de 1925 que Montale atingiu um retumbante sucesso com seu primeiro livro, e, talvez, o mais conhecido: Osso di Seppia (Ossos de sépia), que aqui se refere ao animal, semelhante ao polvo. Esta obra, plena de vigor, é considerada como um dos marcos iniciais do Hermetismo italiano. Em 1927 Montale mudou-se para Florença, onde iniciou um profundo relacionamento com a futura esposa, cujo casamento só ocorreria 35 anos depois, um ano antes do falecimento da noiva (cada um com suas razões!).
Montale seguiu colaborando para várias revistas literárias e alguns de seus poemas foram traduzidos para o inglês por T.S. Elliot (Nobel em 1948). Por ter se recusado a assinar a lista de inscrição ao partido fascista, Montale foi demitido do cargo público de diretor da biblioteca Gabinete Literário. Afinal de contas a dignidade existe é para ser utilizada. A partir daí ele passou a viver da redação de artigos e de traduções. Seu segundo livro de poemas “As ocasiões” (Le occasioni) saiu em 1939. Destaca-se que a produção literária de Montale guardava por vezes longos intervalos entre as publicações.
Em 1945 Montale se mudou para Milão, passando a ser colaborador do Corriere della Sera, o maior jornal italiano, na qualidade de crítico de música. O nome do periódico, que significa Correio da Noite, é devido ao fato de que era vendido originalmente após as 21h. Montale recebeu o doutorado honorífico de conceituadas universidades, dentre elas Roma, Milão, Cambridge e Basel. Em 1966 foi nomeado senador vitalício da República Italiana.
Outras línguas da Alemanha (IV)
O idioma bávaro
A língua bávara, por vezes também designada por austro-bavário, é falada por uma população estimada em 14 milhões de pessoas. Ela é muito mais usada como língua falada do que escrita. Além disso, por não ser ensinada nas escolas, é considerada pela UNESCO como língua em perigo de extinção. Como comentamos no Post anterior, existe muita similaridade fonética e gramatical entre o bávaro e o alemão-austríaco, o que levou à reunião dos dois idiomas sob a designação única de austro-bavário, o qual é falado na Baviera (sul da Alemanha, capital Munique) e em diversas partes da Áustria. O nome da língua é originário da tribo germânica dos bávaros. Em alemão o idioma é designado como bairisch (em bávaro pronunciado como boarish), ao passo que o gentílico (ou seja, o adjetivo relativo à região) é escrito como bayrisch. Na língua alemã o estado sulino é Bayern (Baviera), assim como o famoso time de futebol é Bayern München (Bayern de Munique). Por favor, para aqueles que apreciam a nomenclatura esportiva, pois futebol também é cultura, não confundam o Bayern de Munique com o Bayer Leverkusen. Este último foi fundado em 1904 por funcionários da gigantesca indústria farmacêutica “Bayer”, cuja sede fica na cidade alemã de Leverkusen. Este nome, que não tem nada a ver com “Bayern”, é devido ao sobrenome do fundador da indústria (Friedrich Bayer). Voltemos ao idioma. Vocês podem me perguntar por que o gentílico é escrito com “y”. Parece ter sido um capricho do rei Luís I da Baviera (1786-1868), o qual, por admirar muito a cultura helênica, resolveu inserir na palavra um “y”, que é a vigésima letra do alfabeto grego. Em francês ela é conhecida como “i grego” (i grec). E assim ficou. Muito mais conhecido na história da Alemanha foi o rei Luís II da Baviera (1845-86), neto de Luís I, construtor do emblemático castelo de Neuschwanstein, o qual parece ter sido a inspiração para Walt Disney inseri-lo nos seus nostálgicos desenhos animados. Luís II, pela sua personalidade complexa, era considerado como “louco” pela maioria da população. Tendo assumido o trono aos 19 anos, Luís II não suportava reuniões formais de trabalho, determinando assim que grandes enfeites fossem colocados no centro da longa mesa, de tal forma que ele não tivesse de ver todos os participantes, além de exigir que uma orquestra privada tocasse músicas em altos acordes, o que dificultava sobremaneira a comunicação. De forma intensa e obsessiva, ele foi o patrono do renomado compositor clássico Richard Wagner (1813-83). Luís II teve uma morte precoce, até hoje cercada de muito mistério: apesar de ter sido excelente nadador, seu corpo foi encontrado em uma região rasa do Lago Starnberg, próximo a Munique. As possíveis versões, obviamente excludentes, de suicídio ou de assassinato, alimentam a imaginação de quem se interessa pelo assunto.
Retornemos ao idioma bávaro. Não é nenhuma novidade para o leitor indicarmos que ele possui três dialetos, tal ocorre com quase todas as línguas não oficiais: Bávaro do Norte, do Danúbio e do Sul. Para nossa tranquilidade podemos afirmar que eles são mutuamente inteligíveis. Os linguistas afirmam que as diferenças entre o bávaro e o alemão clássico são maiores do que as existentes entre idiomas semelhantes, mas separados na classificação, como é o caso das duplas dinamarquês/norueguês e tcheco/eslovaco. Para alegria de alguns leitores e, talvez, desespero de outros, posso adiantar que em algum Post, chegaremos a apresentar as características dos mencionados idiomas. Se me permitem uma última digressão, quem gosta de cinema certamente conhece o diretor Rainer Werner Fassbinder (1945-82), morto ainda jovem devido a uma overdose de cocaína. Seus filmes, difíceis, herméticos, polêmicos, ainda são cultuados por um grande público. O curioso é que, quase todos, são legendados. Mas, o que tem isso? Ora, legendados para o alemão, dentro da Alemanha. Obviamente quem fala bávaro entende o alemão, mas a recíproca não existe. Exemplos de algumas palavrinhas (primeiro em bávaro, depois em alemão): obrigado (Dang šee/Danke sehr), por favor (Bidd šee/Bitte sehr), bom dia (Guadn moing/Guten morgen), não entendo (I fašde eana ned/Ich verstehe nicht), eu te amo (I liab di/Ich liebe dich). Números de 1 a 10: oans/eins, zwoa/zwei, drei/drei, fiar/vier, fimf/fünf, seggs/sechs, siem/sieben, åcht/acht, neine/neun, zeene/zehn. Para as despedidas os termos já são bem diferentes do alemão: seavus ou então bfiad di. A primeira palavra, às vezes escrita como servus, tem uma simpática etimologia latina: “sou seu servo”. O termo é usado também como saudação. Da mesma forma o ciao do italiano recolhe suas origens na palavra schiavo (escravo), também cortês, mas um pouquinho exagerada.
Só uma letrinha … (III)
- Causalidade (ligação entre causa e efeito), casualidade (eventualidade, acaso);
- Varrão (porco reprodutor), varão (homem);
- Toro (tronco de árvore), touro (animal);
- Farro (caldo de cevada), farra (diversão);
- Espirar (bafejar, soprar), espirrar (fazer esguichar), expirar (terminar);
- Empegar (ir ao pego, o ponto mais fundo de um rio), empregar (utilizar);
- Escolho (recife), escolha (ato de escolher);
- Deferente (que conduz), diferente (distinto);
- Pleito (escolha, demanda), preito (homenagem);
- Afogo (asfixia, aflição), afago (carícia);
- Possível (que está ao alcance), passível (sujeito a);
- Senário (formado por seis unidades), cenário (palco).
Frase para sobremesa: O verdadeiro conhecimento está na consciência da mudança do nível de percepção (José Saramago, 1922-2010).
Até a próxima!