Escritores que ganharam o Prêmio Nobel de Literatura.
1966: Neste ano houve dois autores premiados: Shmuel Yosef Agnon e Nelly Sachs
Shmuel Yosef Agnon (1888-1970): Nascido em uma cidade na antiga região da Galícia polonesa, na época pertencente ao Império Austro-Húngaro, e hoje localizada na Ucrânia, Agnon foi o primeiro escritor a ganhar o Nobel escrevendo literatura em língua hebraica. Seu sobrenome original era Czaczkes, que foi alterado para Agnon (são esses mistérios que envolvem gente que se dedica a escrever). Na verdade, os textos de Agnon misturam o hebraico rabínico ou religioso e o hebraico moderno, ou seja, o idioma do dia a dia. Ele também escrevia em iídiche, que é uma língua germânica das comunidades judaicas da Europa central e oriental, baseada no alemão e com acréscimos hebraicos e eslavos. Vamos ver em um Post futuro que Isaac Singer, Nobel em 1978, escrevia exclusivamente em iídiche. Agnon era filho de um rabino, que também atuava no comércio de peles. Sua religiosidade era tão intensa que, na data de recebimento do prêmio Nobel, a qual caiu em um sábado, ele primeiramente cumpriu suas obrigações do Sabbath – e olhem que são muitas – para só depois se dirigir ao local da cerimônia, com o rei e a rainha da Suécia o aguardando.
Merece destaque o fato de que Agnon, assim como vários outros ganhadores do Nobel de Literatura, não frequentou escolas, sendo educado exclusivamente por parentes. Muito ligado à leitura e à redação, ele publicou seu primeiro poema aos 15 anos. Com a idade de 20 anos resolveu emigrar para a Palestina, onde viveu por cinco anos, antes de se mudar para a Alemanha em 1913. A produção literária de Agnon foi formada majoritariamente por contos, sendo restrito o número de poemas e de romances. Em 1924, já residindo novamente na Palestina, um incêndio destruiu sua biblioteca e – pior ainda – seus manuscritos (cabe lembrar quantas comodidades temos hoje em dia para salvar arquivos). Outro grande incêndio ocorreu na sua casa em Jerusalém em 1929 (seria Agnon um incendiário?). Em 1931 é publicado seu romance mais conhecido “O dossel da noiva” (The bridal canopy / Hakhnasat kallach), o qual relata, com muito humor, a história de um judeu na Galícia (que, como já vimos, foi uma região histórica da Europa Central) que vagueia por campos e cidades em busca de noivos para suas três filhas.
Agnon ganhou por duas vezes o Israel Prize for Literature (1954 e 58). No discurso de recebimento do Nobel ele comentou: “Alguns veem em meus livros as influências de autores cujos nomes, em minha ignorância, eu nem sequer ouvi, enquanto outros veem as influências de poetas, cujo nome ouvi, mas cujos escritos não li.” Tendo adotado a dieta vegetariana desde a infância, Agnon era sistemático nos seus horários de alimentação e de redação. Certa feita, já muito famoso em todo o país, Agnon comentou com o prefeito de Jerusalém que o ruido dos motores de automóveis atrapalhava a concentração para escrever. No dia seguinte uma placa foi colocada na sua rua: “No entry to all vehicles, writer at work.”
Línguas celtas (V)
A língua escocesa
O idioma gaélico escocês (Gàidhlig), de forma simplificada chamado de escocês, é falado por uma minoria dos habitantes da Escócia, não mais do que 60.000 pessoas. Núcleos de usuários do idioma também são encontrados na província canadense de Nova Scotia (o nome já diz tudo). Veremos a seguir que a língua regional mais falada na Escócia é a Ânglica escocesa, a qual, no entanto, não é de origem celta. A Escócia, chamada em latim de Caledônea, foi invadida pelos romanos no século I. O Reino da Escócia (Alba em escocês), que era um Estado Soberano na Idade Média, foi incorporado ao Reino Unido em 1701. Contudo, as instituições jurídicas, educacionais e religiosas são distintas do restante do Reino Unido, guardando traços de uma consolidada independência. A língua gaélica escocesa chegou ao país no século V, trazida por celtas provenientes do norte da Irlanda, os quais se instalaram na costa ocidental da Escócia, substituindo a língua picta, dos descendentes das tribos da Idade de Ferro. No século XI o escocês já era falado em toda a Escócia, até que, a partir do século XVI o inglês passou a ser o idioma mais utilizado. Com o passar do tempo a língua escocesa foi se deslocando até a parte setentrional do país (Highlands ou Terras Altas), que é onde se concentram atualmente os falantes do gaélico escocês. A preservação da língua foi ajudada pelos bardos (contadores de história, cantores) que se instalaram no século XVI nas Ilhas Hébridas, ao norte da Escócia. No século XVIII havia punição para as crianças que falassem escocês nas escolas. Pouco a pouco o idioma local foi recuperando sua importância, sendo que, hoje em dia, existem até programas de rádio e TV em escocês. Os últimos falantes monolíngues do escocês morreram na década de 1970.
No grupo das línguas celtas, o escocês é mais relacionado ao manquês (que veremos em outro Post), estando distante do bretão, galês e córnico. O alfabeto do gaélico escocês possui 18 letras do alfabeto latino (não existem as letras J,K,Q,V,X,Z). Algumas palavras e expressões: Móran taing (obrigado), Ma’s e do thoile (por favor), Gabh mo leisgeul (desculpe), Madainn mhath (bom dia), Beannachd leat (até logo), Chan eil mi’tuigsinn (não entendo), Tha gaol agam ort (eu te amo). Se vocês tiverem a impressão de que digitei alguma letra erradamente, por favor me avisem. Números de 1 a 10: aon, dà/dhà, tri, ceithir, còig, sai, seachd, ochd, naoi, deich. Dias da semana: Diluain, Dimàirt, Diciadain, Diardaoin, Dihaoine, Disatharma, Didòmhnaich. São muito semelhantes ao irlandês (visto no Post anterior), incluindo também aquela curiosidade relativa aos dias de jejum na nomenclatura de quarta-feira a sexta-feira.
Como escrevi em parágrafo anterior, a língua regional mais difundida na Escócia é o Ânglico escocês, também conhecido por Scots ou ainda Escocês das Terras Baixas (para diferenciá-lo do gaélico escocês) que é falado por aproximadamente 1,5 milhão de pessoas. Embora não seja de origem celta, acho pertinente apresentá-la aqui neste Post. Existem muitas controvérsias sobre o desenvolvimento histórico dessa língua, que alguns filólogos consideram como um mero dialeto do inglês antigo. Todavia sua similaridade é maior com a língua norueguesa. Na colocação gramatical das palavras, já voltamos à ordem normal (pelo menos para nós) de SVO (Sujeito-Verbo-Objeto). Algumas palavras e expressões em Scots: Thank ye (obrigado), Excuise me (desculpe), Guid mornin (bom dia), Guidbye (até logo), Ay/Naw (Sim/Não), A dinnae unnerstaun (não entendo), A love ye (eu te amo). Números de 1 a 10: wan, twa, three, fower, five, sax, seiven, echt, nine, ten. Dias da semana: Monanday, Tysday, Wadensday, Fuirsday, Friday, Saturday, Sunday. Caros leitores, se alguns de vocês se entusiasmaram e já estão querendo incluir o Scots no currículo de línguas que vocês dominam, façam antes um teste: entrem no Youtube e escutem, por poucos minutos, alguma conversa nesse idioma ou então descubram no Google um trecho do Scots escrito. E aí tomem a decisão. Na verdade, se ouvirmos um escocês, principalmente se for jovem, falando em inglês, vamos ter a impressão de que se trata de um outro idioma. Como eu gosto de repetir, por isso as línguas são tão fascinantes.
Pequenos mal-entendidos na formação de palavras
A seguir são apresentadas algumas origens curiosas de palavras. Nunca é demais destacar que a etimologia de nomes está muito longe de ser uma ciência exata. É frequente a existência de explicações diversas, sem se saber qual seria efetivamente a opção correta.
- Canguru: diz a história que o navegador inglês James Cook (1728-79), por sinal, um dos maiores aventureiros que já passaram por esse planeta, atracou seus barcos em alguma parte da ilha australiana. Ao observarem a presença de um canguru, animal que não era conhecido por eles, perguntaram o nome. Um dos nativos respondeu simplesmente: Kan-gu-ru, o que significaria “eu não sei” no idioma local.
- A mesma dificuldade, porém, com consequência distinta, tiveram os conquistadores espanhóis na terra dos incas. Ao encontrarem um animal desconhecido, perguntaram “como se llama”. Muito cordatos, os nativos apenas repetiram a última palavra da pergunta.
- Na língua algonquina (falada no Nordeste do Canadá) a expressão utilizada para designar os povos do Norte gelado era askimowew, ou seja, “aquele que come carne crua.” Tal designação é ofensiva para os esquimós, cuja etnia é denominada corretamente como Inuit (o povo).
- De novo os espanhóis, agora nas terras maias do México. Como os nativos não entendiam o idioma espanhol, perguntavam Iucatan (o que dizem?), que veio a ser o nome adotado para a famosa península.
- Esta agora é para os franceses. Há uma palavra, Vasistas, que designa os postigos de vidro que se abrem sobre as portas. Como os alemães perguntavam o que era aquilo (Was ist das?), os franceses achavam que esse era o nome dado pelos alemães à pequena estrutura.
Frase para sobremesa: A felicidade não é algo que se alcance diretamente, é um subproduto, um efeito colateral, assim como o suor após um exercício físico (Aldous Huxley, 1894-1963).
Bom descanso!