Escritores que ganharam o Prêmio Nobel de Literatura.
1959: Salvatore Quasimodo (1901-68): Foi um poeta italiano, figura proeminente no Hermetismo (jogo livre de parábolas e metáforas, com sentido secreto e impenetrável), movimento literário que surgiu na Itália no período entre as duas Grandes Guerras. De início, um esclarecimento sobre o curioso sobrenome do Salvatore, que nos remete a Quasímodo, o corcunda de Notre-Dame, imortalizado no clássico de Victor Hugo (1802-85) Notre-Dame de Paris, 1831. Mas existe um outro significado para “quasímodo”, qual seja, a denominada “Pascuela” ou “Pequena Páscoa”, que vem a ser a comemoração do primeiro domingo depois da Páscoa. Nesse dia a missa se inicia com as palavras quasi modo (latim para: “do mesmo modo”). Portanto, essa é a origem do sobrenome do famoso poeta. Observe-se que, no referido nome próprio, a pronúncia continua proparoxítona (sílaba tônica no “i”, embora não leve acento).
Salvatore nasceu na Sicília, filho de um mestre de obras. A influência do pai o conduziu ao estudo da Engenharia Civil em Roma (com ele, já são três laureados com essa formação: José Echegaray (Nobel em 1904, v. Post 2), Henrik Pontoppidan (1917, interrompeu os estudos, v. Post 9) e agora o hermético Quasimodo. Em 1920 muda-se para Roma, tanto para cumprir o curso superior, quanto para o estudo do Grego e do Latim. Em 1926 se transfere, por questão de trabalho, para Reggio Calabria, onde retoma sua atividade poética. Na época estreita o contato com Eugenio Montale (1896-1981), ligado ao mesmo movimento literário. Embora apenas cinco anos mais velho que Salvatore, Montale recebe o Nobel em 1975, portanto 16 anos após seu pupilo. Em 1934, já vivendo em definitivo em Milão, Salvatore continua a participar intensamente do ambiente cultural da cidade, inclusive traduzindo para o italiano obras do britânico William Shakespeare (1564-1616), do poeta norte-americano e.e. cummings, 1894-1962 (sim, em minúsculas, pois é assim que ele assinava e publicava) e do poeta chileno Pablo Neruda (Nobel em 1971, 1904-73).
Salvatore era participante da comunidade franco-maçônica, espalhada por todo o mundo e que prega a prática da fraternidade e da filantropia entre seus membros. Em 1941, ainda em Milão, Salvatore assume a cátedra de Literatura Italiana no conhecido Conservatório de Milão, onde funciona a Universidade Italiana de Música. Na época ele fez fortes críticas à Segunda Guerra Mundial, decidindo se tornar membro do Partido Comunista Italiano em 1945. Merecem destaque as atividades literárias feitas em conjunto com Cesare Zavattini (1902-89), um dos mais renomados teóricos do Neorrealismo italiano. É dele o roteiro do filme “Ladrões de Bicicleta” (Ladri di biciclette, 1948), dirigido por Vittorio de Sica (1901-74), possivelmente a película mais celebrada como representante do cinema neorrealista. Em 1967 Salvatore recebe o título de Doutor honoris causa da prestigiada Universidade de Oxford, na Inglaterra. No ano seguinte, quando estava na cidade turística de Amalfi, preparando-se para discursar em um congresso, ele sofreu uma hemorragia cerebral, vindo a falecer poucos dias depois em um hospital de Nápoles.
Línguas da França (V)
As línguas de oïl (continuação)
Loreno: o idioma loreno (Lorrain) consiste, na verdade, em um conjunto de sete dialetos, vários deles com subvariantes, formando-se assim um incrível mosaico de línguas, cada uma contando com poucos falantes. Na fronteira da França com a Bélgica o idioma loreno é conhecido como gaumais.
A Lorena (francês: Lorraine, alemão: Lothringen) é uma região histórica da França, a qual sempre sofreu uma forte influência germânica, tendo sido a única província a possuir fronteiras com três países: Bélgica, Luxemburgo e Alemanha. Na divisão do Império Carolíngio (751-987, período dos reis francos que sucederam à dinastia merovíngia, que saudades das aulas de História Geral) o rei Lotário I ficou com a região da Lorena, ao rei Carlos, o Calvo, coube a França e Luís, o Germânico ficou com a Germânia. Não resisto a um brevíssimo comentário sobre a charmosa nomenclatura dos reis carolíngios: no Post anterior vimos, Carlos, o Simples, mas temos ainda Pepino, o Breve (pai de Carlos Magno); Pepino, o Velho; Luís, o Moço; Luís, o Jovem (não eram os mesmos); Luís I, o Piedoso; Luís III, o Gago; Luís V, o Indolente. Acho que basta. Na sequência histórica, o Reino da Lorena desapareceu, passando a fazer parte da Germânia (que não coincide com a atual Alemanha, era bem maior). Com o passar do tempo o Reino da França foi gradativamente tomando controle, até incorporar a Lorena ao seu território. Atualmente ela é uma região altamente industrializada, notadamente nos setores metalúrgico e têxtil. Sua capital é Metz e a segunda maior cidade Nancy. As intensas trocas científicas e culturais com a Alemanha ajudaram a colocar a Lorena em um alto patamar de desenvolvimento. Já a cidade homônima no Estado de São Paulo tem como origem o sobrenome do governador da Capitania: Bernardo José Lorena (agora, se este nome, por sua vez, busca homenagear a região francesa, isso já seria uma outra história).
O idioma loreno foi recebendo, ao longo do tempo, claras influências célticas e germânicas. Um exemplo é a frase para perguntar a alguém “como vai” Ça geht’s?, muito semelhante ao alemão (Wie gehts?) e absolutamente distinto do francês. Não inseriremos aqui as tradicionais expressões do dia a dia, como tenho feito com muitas línguas, já que o leque de variantes é muito amplo. Mas não custa apresentar a mais bela das palavras: Märsi (obrigado). Na fonética do loreno, a letra “h” no início das palavras é pronunciada como no inglês. Na língua francesa essa pobre consoante é simplesmente ignorada na expressão oral. Outras curiosas características: o uso sistemático de artigos antes dos nomes de pessoas, a utilização de verbos distintos daqueles do francês (p.ex. para “fechar” não se usa fermer, mas clencher), a pronúncia mais alongada da letra “y” (pays não é falado como “pêí”, mas “pêii”). Uma última curiosidade: no imperfeito existe a discreta partícula or para se designar um evento ocorrido há mais tempo. Se ontem vi pela janela “as nuvens que passavam pelo céu”, quando me refiro a um tempo mais antigo, a construção é distinta: “meu avô via as nuvens que passavam or pelo céu”. Não são fascinantes tais volteios de linguagem?
Borgonhês: idioma falado na região histórica da Borgonha (em francês Bourgogne), que foi habitada desde o século VI a.C, sucessivamente por celtas, gauleses, romanos e germânicos (principalmente da tribo dos Burgúndios, de onde deriva o topônimo) e francos. A Borgonha, que é situada na zona oriental da França, é conhecida por ser uma das mais importantes regiões de vitivinicultura do mundo. Sua capital é Dijon (claro, todos nós nos lembramos da famosa mostarda).
Existem pelo menos sete dialetos do borgonhês, os quais são, muitas vezes, menosprezados pelos franceses, que o associam a pessoas incultas (mas eles continuam bebendo do seu vinho). Algumas particularidades do idioma: os artigos franceses le e la se convertem em lou e lai. Assim, le jour (o dia) passa a ser lou jor e, claro, bom-dia só poderia ser bonjor. O “sim” e “não” são sai e non. O significado de alguns verbos também se transforma: por exemplo “pensar” (penser em francês) é cuider em borgonhês. Notem que aqui temos, por coincidência ou não, umas das acepções do nosso verbo “cuidar”. Na comparação entre os idiomas francês e borgonhês, nota-se a existência de transformações nas grafias mediante o concurso de trocas, inserções e supressões de letras. Alguns exemplos (a primeira palavra em francês, a segunda em borgonhês: homem (homme/houme), para (pour/por), torre (tour/tor), cavalo (cheval/chevau), cachorro (chien/chein), vaca (vache/vaiche), primeiro (premier/premei), branca (blanche/blainche). Entendo quando as crianças perguntam por que não falamos todos a mesma língua.
Figuras de linguagem
Congérie: figura que consiste numa série de termos de mesma natureza e função: O primo, emproado, fanfarrão, ostentoso, espaventoso, quedava-se encostado à balaustrada.
Com a congérie, terminamos a extensa lista de figuras de linguagem apresentadas nos Posts. Nas próximas publicações continuaremos a mostrar os aspectos mais interessantes da Língua Portuguesa, além das características dos idiomas de muitos países.
Frase para sobremesa: Uma homenagem a Quasimodo com uma frase não tão hermética assim: O poeta não tem medo da morte, não porque ele acredite na fantasia de heróis, mas porque a morte, ao visitar constantemente seus pensamentos, é a imagem de um diálogo sereno.
Até a próxima!